Período de graça e configuração do crime de deserção
Eventual irregularidade do termo de deserção apenas tem o condão de afastar a tipicidade da conduta quando, a partir dele, as Forças Armadas excluírem o militar durante o período de graça, que é o período de oito dias de ausência do militar, necessário para a configuração do crime de deserção (CPM, art. 187: “Ausentar-se o militar, sem licença, da unidade em que serve, ou do lugar em que deve permanecer, por mais de oito dias”). Com base nesse entendimento, a Segunda Turma denegou a ordem em “habeas corpus” no qual pleiteado reconhecimento da atipicidade da conduta de militar condenado pela prática do referido crime. O Colegiado reiterou o quanto decidido no HC 121.190/BA (DJe de 11.4.2014) no sentido de que o crime de deserção seria próprio e, por isso, somente poderia ser praticado por militar. Sua consumação se daria com a ausência injustificada por mais de oito dias. A lavratura antecipada e equivocada do termo de deserção — antes, portanto, de findar o oitavo dia de ausência — acarretaria a perda da condição de militar, passando o agente a ostentar a condição de civil, situação impeditiva da consumação da referida figura delitiva. No caso, entretanto, ainda que se considerasse presente eventual equívoco na elaboração do termo de deserção, ele não teria importado em exclusão do paciente das Forças Armadas, no período de graça. O militar não teria comparecido à formatura matinal de 21.6.2005. O período de graça teria começado a correr à zero hora do dia seguinte — 22.6.2005 (CPPM, art. 451, § 1º) —, findando-se à zero hora do dia 30.6.2005. Assim, se ele fosse excluído após a zero hora do dia 30 de junho, quando já consumada a deserção no primeiro minuto daquele dia, ter-se-ia que o termo de deserção em questão — datado de 30 de junho — teria sido lavrado corretamente. Ou seja, ele se tornara civil após a consumação do delito. Outrossim, não prosperaria a alegação de que o termo de deserção seria prova única e definitiva, por supostamente trazer “os elementos necessários para a ação penal”. A literalidade do art. 452 do CPPM deixaria claro que o referido elemento informativo teria o caráter de instrução provisória e seria destinado a fornecer os elementos necessários à propositura da ação penal. Assim, caberia ao juízo natural da causa penal, com observância ao princípio do contraditório, proceder ao exame das provas colhidas e conferir a definição jurídica adequada para os fatos que fossem comprovados, o que teria ocorrido na espécie.
HC 126520/RJ, rel. Min. Teori Zavascki, 5.5.2015. (HC-126520)